Por Claire Xavier
Esse é um pedido que escuto dos meus filhos várias vezes por dia. Eles saem para brincar e andar de bicicleta na quadra aqui perto de casa e a mãe já pensa em mil coisas que pode fazer para aproveitar o intervalo – lavar a louça acumulada, estender as roupas que estão na máquina desde ontem, preparar alguma atividade ou brincadeira ‘educativa’ para fazer depois do almoço. Mas não. Eles fazem questão de me tirar do meu ativismo e me colocar sentada ali na escada nada confortável que dá acesso à quadra, de baixo do sol quente do Cerrado, para ficar olhando. Só olhando. Quem me conhece imagina a luta que isso é para mim! Dois minutos se passam e tenho certeza que eles nem lembram mais que estou lá. Tento sair ‘de fininho’ para encarar aquela louça, mas logo escuto de novo, “Mãe! É pra ficar me olhando!”
Bom, se tem alguma coisa que esse tempo de quarentena tem me proporcionado é a oportunidade de refletir em quem sou como mãe. Nunca fiquei tanto tempo com os meus dois filhos em casa, e sabe aquelas mães que sempre sonharam em fazer homeschooling? Pois é, não sou essa mãe. Nunca fui, e depois dessa experiência tenho certeza que nunca serei. Não por conta das crianças, mas porque sei das minhas próprias limitações e pensar em ter que ser mãe e professora ao mesmo tempo me dá até calafrios!
Portanto, a atual situação pede certa flexibilidade, e já que não sou de recuar diante de um desafio respirei fundo, fiz uma oração de súplica, e fui atrás de inspiração.
Horas depois e com dezenas de ‘prints’ no celular de receitas de massinha caseira com corantes naturais, salas de aula no estilo Montessori, e caça-tesouros super elaborados, estava pronta! (Já consigo ouvir as outras mães dando uma risadinha e pensando “coitada!”)
Pois é. Coitada. 20 dias de quarentena se passaram, minha casa estava um caos, as tarefas das crianças todas atrasadas, e o consumo de açúcar e conservantes aumentando na mesma velocidade que a minha paciência e convicção de ser uma espécie de supermãe/educadora diminuíam.
Certo dia estava eu sozinha com as crianças na hora do banho (ah, a hora do banho! Lá vêm os calafrios de novo…) e a paciência estava indo pro ralo junto com a água. Gritei, ameacei, chantageei. Todas as coisas que as mães do Instagram jamais fariam.
Finalmente consegui fazer o pequeno dormir e fui comprar a última briga do dia com a mais velha. Deitei com ela na cama, sonhando com uma série no Netflix e uma taça de… suco. De repente veio aquela voz que fala ao coração de toda mãe nessas horas, me tirando toda a paz. A voz da Culpa (com C maiúscula). Sabe qual é, né mães? Pois é. Ela veio suspirando no meu ouvido: Que fracasso! Que dia! Eles merecem melhor!
Mas amanhã vou ser melhor. Mais paciente. Amanhã vou fazer aquela massinha caseira e treinar a letra cursiva que a tia pediu. Amanhã não vou gritar e o lanche vai ser salada de frutas.
De repente uma mãozinha no meu braço me tirou dos meus pensamentos. Minha filha, já quase dormindo, virou para mim, abriu os olhos e falou bem baixinho, “mamãe, você sabia que não existe mãe melhor que você?” Em Silêncio segui e ela fechou de novo os olhos. Eu não soube responder. Dei mais um beijo, enxuguei a lágrima e saí do quarto devagarinho.
Donald Winnicott, pediatra e psicoanálista (? Seria psicanalista), fala na sua teoria de desenvolvimento da criança sobre a mãe ‘suficientemente boa’. Sua teoria sugere que quando a mãe tenta ser perfeita, acaba sofrendo mais do que deveria, pois suas expectativas acabam sendo frustradas, fazendo mal tanto para ela quanto para a criança. Diz ele que:
“A maternidade é feita de aventuras, emoções, risos, lágrimas e de lições também. A mãe suficiente consegue dar um significado positivo para a falha porque ela sabe que pode tentar de novo.”
E o que seria esse ‘tentar de novo’? É finalmente fazer a receita de massinha salva no celular? Conseguir deixar a casa arrumada, ou pelo menos a pia vazia?! Ou será que esse ‘tentar de novo’ não seria apenas aprender a sentar na quadra e fazer a única coisa que meus filhos estão me pedindo (além dos 28 lanches por dia, claro) – aquilo que faz minha filha acreditar que não existe mãe melhor do que eu.
“Tá bom, filha! Vou ficar aqui te olhando!”
Na mesma hora em que as palavras saíram da minha boca, eu entendi o pedido dela. Afinal, não é o que todos nós estamos pedindo?!
Queridas mães, mães do Instagram e mães da quadra, que sejamos reais! Falhas! Inqu ietas e impacientes… suficientemente boas e sim, as melhores mães do mundo! Que o nosso maternar seja leve, e que ao pedir que alguém olhe para nós (sim, também precisamos!) possamos saber que o nosso Pai está ali, sentadinho, deixando todo o resto para ficar olhando para nós enquanto olhamos para eles.
Feliz nosso dia ❤️
Foto: Babuska
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